http://gonline.uol.com.br/site/arquivos/estatico/gnews/gnews_papocabeca_24.htm
Por Klecius Borges
29.09.04
Uma das características da sociedade ocidental, pós-moderna e globalizada, na qual vivemos, é um certo prolongamento da adolescência.
Muitos adolescentes de hoje, assustados, por um lado, com a enorme competitividade do mercado de trabalho e estimulados por outro, por uma cultura individualista, voltada para o prazer e para a satisfação imediata dos desejos de consumo, tendem a adiar sua entrada no mundo adulto.
A psicanalista Maria Rita Kehl, no último programa, Café Filosófico, transmitido pela TV Cultura, ao tratar do tema das drogas, observou que as duas principais portas de entrada disponíveis para os jovens do nosso tempo são o shopping center e as drogas. Como contraponto a essas possibilidades limitadas, a psicanalista lembrou o papel importante que atividades culturais, criativas, sociais e políticas, desenvolvidas em grupo, têm para uma iniciação menos alienada e solitária.
Ao vê-la falar, não pude deixar de pensar no adolescente gay. Embora o processo seja substancialmente o mesmo, creio que para o jovem homossexual, as dificuldades tendem a ser maiores.
De uma forma geral, os gays fazem essa transição para o mundo adulto, escondendo um dos pilares de sua identidade, a sexualidade. Enquanto os jovens heterossexuais exercem com relativa liberdade seu direito à experimentação e à exploração de suas possibilidades afetivo-sexuais , os gays são obrigados a disfarçar e a dissimular seus desejos e anseios, e, muito freqüentemente, a mentir sobre aspectos essenciais de sua vida.
Se considerarmos o caráter grupal do qual se reveste a experiência adolescente e o papel fundamental que a aceitação pelo grupo de referência tem na formação da auto-estima e na consolidação da auto-imagem, podemos entender os sentimentos recorrentes de solidão e abandono de que se queixa a maioria dos gays.
Se para o adolescente heterossexual, as alternativas são hoje tão limitadas, o quer dizer das oferecidas aos homossexuais? Onde estão os grupos de apoio nas escolas, os grêmios com comitês de diversidade, as equipes esportivas inclusivas, os centros de convivência comunitários etc.?
Abandonados à própria sorte e compelidos a se confinar em ambientes fechados e isolados (os chamados guetos), muitos gays acabam construindo sua identidade adulta baseada fortemente na sexualidade e apoiada na invisibilidade social. Esses ambientes, quase sempre mediados por álcool e drogas, favorecem o hedonismo e estimulam o consumo desenfreado dos bens “de imagem” (roupas e objetos de desejo, hábitos, juventude etc.). Uma espécie de ilha da fantasia, na qual a moeda de troca é o prazer e a satisfação das necessidades narcisísticas.
Jovens heterossexuais também vivem de forma muito semelhante essa cultura do prazer a qualquer preço. Também são estimulados pela sociedade de consumo a viver intensamente, a gozar ao máximo e a adiar as responsabilidades do mundo adulto. A diferença é que mais cedo ou mais tarde serão chamados a cumprir alguns dos papéis que a sociedade heterocentrada lhes reserva. Entre eles, os de chefe de família e cidadão de respeito.
Já dos gays não se espera “muito”. Apenas que se transformem em héteros e assumam os papéis sociais apropriados, ou então, que continuem invisíveis. A não ser em ocasiões especiais e em lugares específicos, perpetuando assim a caricatura (alegre e trágica) no imaginário popular.
Muitos gays internalizam essas expectativas e permanecem eternos adolescentes. Escondidos, infelizes, mas se divertindo muito, entre uma balada e outra; mascarando suas dores com uma nova conquista sexual ou com a droga da hora; e sobretudo, fingindo que os anos não passam.
Klecius Borges é psicólogo (CRP 06/6283) e atua em terapia afirmativa
terapiafirmativa@uol.com.br
Muitos adolescentes de hoje, assustados, por um lado, com a enorme competitividade do mercado de trabalho e estimulados por outro, por uma cultura individualista, voltada para o prazer e para a satisfação imediata dos desejos de consumo, tendem a adiar sua entrada no mundo adulto.
A psicanalista Maria Rita Kehl, no último programa, Café Filosófico, transmitido pela TV Cultura, ao tratar do tema das drogas, observou que as duas principais portas de entrada disponíveis para os jovens do nosso tempo são o shopping center e as drogas. Como contraponto a essas possibilidades limitadas, a psicanalista lembrou o papel importante que atividades culturais, criativas, sociais e políticas, desenvolvidas em grupo, têm para uma iniciação menos alienada e solitária.
Ao vê-la falar, não pude deixar de pensar no adolescente gay. Embora o processo seja substancialmente o mesmo, creio que para o jovem homossexual, as dificuldades tendem a ser maiores.
De uma forma geral, os gays fazem essa transição para o mundo adulto, escondendo um dos pilares de sua identidade, a sexualidade. Enquanto os jovens heterossexuais exercem com relativa liberdade seu direito à experimentação e à exploração de suas possibilidades afetivo-sexuais , os gays são obrigados a disfarçar e a dissimular seus desejos e anseios, e, muito freqüentemente, a mentir sobre aspectos essenciais de sua vida.
Se considerarmos o caráter grupal do qual se reveste a experiência adolescente e o papel fundamental que a aceitação pelo grupo de referência tem na formação da auto-estima e na consolidação da auto-imagem, podemos entender os sentimentos recorrentes de solidão e abandono de que se queixa a maioria dos gays.
Se para o adolescente heterossexual, as alternativas são hoje tão limitadas, o quer dizer das oferecidas aos homossexuais? Onde estão os grupos de apoio nas escolas, os grêmios com comitês de diversidade, as equipes esportivas inclusivas, os centros de convivência comunitários etc.?
Abandonados à própria sorte e compelidos a se confinar em ambientes fechados e isolados (os chamados guetos), muitos gays acabam construindo sua identidade adulta baseada fortemente na sexualidade e apoiada na invisibilidade social. Esses ambientes, quase sempre mediados por álcool e drogas, favorecem o hedonismo e estimulam o consumo desenfreado dos bens “de imagem” (roupas e objetos de desejo, hábitos, juventude etc.). Uma espécie de ilha da fantasia, na qual a moeda de troca é o prazer e a satisfação das necessidades narcisísticas.
Jovens heterossexuais também vivem de forma muito semelhante essa cultura do prazer a qualquer preço. Também são estimulados pela sociedade de consumo a viver intensamente, a gozar ao máximo e a adiar as responsabilidades do mundo adulto. A diferença é que mais cedo ou mais tarde serão chamados a cumprir alguns dos papéis que a sociedade heterocentrada lhes reserva. Entre eles, os de chefe de família e cidadão de respeito.
Já dos gays não se espera “muito”. Apenas que se transformem em héteros e assumam os papéis sociais apropriados, ou então, que continuem invisíveis. A não ser em ocasiões especiais e em lugares específicos, perpetuando assim a caricatura (alegre e trágica) no imaginário popular.
Muitos gays internalizam essas expectativas e permanecem eternos adolescentes. Escondidos, infelizes, mas se divertindo muito, entre uma balada e outra; mascarando suas dores com uma nova conquista sexual ou com a droga da hora; e sobretudo, fingindo que os anos não passam.
Klecius Borges é psicólogo (CRP 06/6283) e atua em terapia afirmativa
terapiafirmativa@uol.com.br
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