Fonte:
http://www.geocities.com/girl_ilga/textos/lesbicasalemanha.htm
Introdução do livro Lesbians in Germany: 1980’s-1920’s (1990) de Lillian Faderman e Brigitte Eriksson , Naiad Press.
“Amigas românticas” alemãs
Em 1805, Bettine von Arnim, uma jovem alemã, escrevia a Caroline Gunderode, uma mulher com mais 8 ou 10 anos do que ela:
Se não existisses, o que seria o mundo para mim? Sou como morta se não me pedires que me levante e viva continuamente contigo. Tenho a certeza que a minha vida acorda apenas quando me chamas e que a minha vida morrerá se não puder continuar a crescer em ti. Sim, sei, a minha vida é insegura; sem o teu amor, no qual está plantada, a minha vida nunca florirá.
Gunderode correspondia à sua paixão e necessidade, declarando: “Tu és o meu raio de sol que me aquece, enquanto que em todo o outro lado a geada cai sobre mim." A correspondência volumosa entre estas duas mulheres sugere um caso amoroso de grande paixão, no qual elas ofereceram uma à outra não apenas um afecto intenso, mas também apoio emocional e estímulo intelectual. Como muitas outras mulheres do seu tempo, noutros países, Bettine e Caroline viam-se a si próprias como "amigas românticas".
Apesar da grandeza do seu amor, Bettine e Caroline não viveram juntas. Poucas eram as mulheres que o faziam nos princípios do século XIX, quando não havia praticamente oportunidade de auto-suficiência económica para as mulheres de classe média e alta. Esperava-se destas que casassem ou que entrassem para um convento ou outro retiro feminino semelhante. Caroline Gunderode, filha de uma viúva com vários outros filhos, escolheu este último caminho, tornando-se conega da sua ordem religiosa.
As duas mulheres poderiam, é claro, ter fugido juntas como tinham feito na geração anterior na Inglaterra duas lésbicas, Sarah Ponsonby e Eleanor Butler, as Senhoras de Llangollen -- mas talvez não tenham podido, ou não tenham querido arriscar a fúria de amigos e família que as Senhoras de Llangollen tiveram de suportar. Se Bettine e Caroline fossem das classes mais baixas, uma delas poderia ter envergado roupas de homem, obtido trabalho manual sob esse disfarço, e as duas poderiam ter passado por marido e mulher. Mas mudar de classe, no início do séc. 19, era ainda mais difícil do que mudar de género. Além disso, Bettine e Caroline poderiam ter tido conhecimento do caso de uma outra alemã, Catarina Margarethe Linck, queimada na fogueira em 1721 por ter tentado passar por homem e por ter casado com outra mulher. Mas apesar de não terem passado a vida juntas, a sua correspondência indica que, como muitas outras "amigas românticas" da época, foram amantes em todos os sentidos excepto talvez o genital (é muito pouco provável que tivessem posto essa experiência por escrito, mesmo que a tivessem tido). Para nós, tão próximas do fim do séc. XX, poderá parecer incrível que duas mulheres possam ter estado tão apaixonadas sem nunca referirem o seu "estatuto marginal" enquanto lésbicas, ou o seu receio de serem descobertas, ou o significado político do seu envolvimento uma com a outra. Contudo, tal falta de percepção era possível antes do advento dos sexólogos em finais do séc. XIX, quando informaram o mundo da existência de enormes quantidades de mulheres que amavam outras mulheres, de maneiras que ultrapassavam o afecto entre irmãs -- e que semelhante amor era mórbido.
http://www.geocities.com/girl_ilga/textos/lesbicasalemanha.htm
Introdução do livro Lesbians in Germany: 1980’s-1920’s (1990) de Lillian Faderman e Brigitte Eriksson , Naiad Press.
“Amigas românticas” alemãs
Em 1805, Bettine von Arnim, uma jovem alemã, escrevia a Caroline Gunderode, uma mulher com mais 8 ou 10 anos do que ela:
Se não existisses, o que seria o mundo para mim? Sou como morta se não me pedires que me levante e viva continuamente contigo. Tenho a certeza que a minha vida acorda apenas quando me chamas e que a minha vida morrerá se não puder continuar a crescer em ti. Sim, sei, a minha vida é insegura; sem o teu amor, no qual está plantada, a minha vida nunca florirá.
Gunderode correspondia à sua paixão e necessidade, declarando: “Tu és o meu raio de sol que me aquece, enquanto que em todo o outro lado a geada cai sobre mim." A correspondência volumosa entre estas duas mulheres sugere um caso amoroso de grande paixão, no qual elas ofereceram uma à outra não apenas um afecto intenso, mas também apoio emocional e estímulo intelectual. Como muitas outras mulheres do seu tempo, noutros países, Bettine e Caroline viam-se a si próprias como "amigas românticas".
Apesar da grandeza do seu amor, Bettine e Caroline não viveram juntas. Poucas eram as mulheres que o faziam nos princípios do século XIX, quando não havia praticamente oportunidade de auto-suficiência económica para as mulheres de classe média e alta. Esperava-se destas que casassem ou que entrassem para um convento ou outro retiro feminino semelhante. Caroline Gunderode, filha de uma viúva com vários outros filhos, escolheu este último caminho, tornando-se conega da sua ordem religiosa.
As duas mulheres poderiam, é claro, ter fugido juntas como tinham feito na geração anterior na Inglaterra duas lésbicas, Sarah Ponsonby e Eleanor Butler, as Senhoras de Llangollen -- mas talvez não tenham podido, ou não tenham querido arriscar a fúria de amigos e família que as Senhoras de Llangollen tiveram de suportar. Se Bettine e Caroline fossem das classes mais baixas, uma delas poderia ter envergado roupas de homem, obtido trabalho manual sob esse disfarço, e as duas poderiam ter passado por marido e mulher. Mas mudar de classe, no início do séc. 19, era ainda mais difícil do que mudar de género. Além disso, Bettine e Caroline poderiam ter tido conhecimento do caso de uma outra alemã, Catarina Margarethe Linck, queimada na fogueira em 1721 por ter tentado passar por homem e por ter casado com outra mulher. Mas apesar de não terem passado a vida juntas, a sua correspondência indica que, como muitas outras "amigas românticas" da época, foram amantes em todos os sentidos excepto talvez o genital (é muito pouco provável que tivessem posto essa experiência por escrito, mesmo que a tivessem tido). Para nós, tão próximas do fim do séc. XX, poderá parecer incrível que duas mulheres possam ter estado tão apaixonadas sem nunca referirem o seu "estatuto marginal" enquanto lésbicas, ou o seu receio de serem descobertas, ou o significado político do seu envolvimento uma com a outra. Contudo, tal falta de percepção era possível antes do advento dos sexólogos em finais do séc. XIX, quando informaram o mundo da existência de enormes quantidades de mulheres que amavam outras mulheres, de maneiras que ultrapassavam o afecto entre irmãs -- e que semelhante amor era mórbido.
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