sexta-feira, 4 de julho de 2008
Avanço social Primeiro grau impulsiona garantia de direitos aos gays
por Sylvia Mendonça do Amaral
Recentes notícias veiculadas na mídia nacional demonstram, com nitidez, as transformações pelas quais vem passando nossa sociedade, entre elas, o crescimento do respeito à orientação sexual dos indivíduos. Três exemplos atuais comprovam o fato.
O primeiro deles vem da região Nordeste, mais exatamente da justiça de Pernambuco, que concedeu a uma homossexual o direito de receber pensão previdenciária em decorrência do falecimento de sua companheira. Decisão essa que segue entendimento já adotado pelo Superior Tribunal de Justiça.
O segundo vem do Ministério do Desenvolvimento Agrário, que passou a reconhecer a união estável dos seus funcionários homossexuais e a possibilidade de que eles sejam inclusos como dependentes nos benefícios concedidos. A decisão veio da assessoria jurídica da pasta ao analisar pedido de um dos servidores do ministério que queria incluir seu companheiro como dependente.
Embora a união estável entre pessoas do mesmo sexo não esteja prevista na Constituição brasileira, e não exista legislação que trate do assunto, a assessoria jurídica do MDA baseou sua decisão em outras já tomadas pela Justiça brasileira, ao interpretar conceitos constitucionais como o direito à igualdade.
Por fim, o terceiro e último exemplo vem do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul — notoriamente inovador com relação aos outros tribunais brasileiros quando se fala em causas homossexuais —, ao reconhecer a união estável entre duas mulheres e determinar que a companheira viúva entre na partilha de bens.
Essa postura do Tribunal do Rio Grande do Sul, que há pouco tempo era o único a reconhecer as uniões homoafetivas, foi determinante para que desembargadores de tribunais de outros estados passassem a decidir da mesma forma. É o que se evidencia da decisão proferida pelo juiz de primeira instância de Pernambuco. É evidente que tal decisão pode ser alterada quando for apreciada pelos desembargadores em segunda instância, mas não se pode deixar de considerá-la um avanço.
Nesse sentido, também a recente decisão do TJ gaúcho deve ser vista como uma demonstração de firmeza em seu propósito de fazer justiça e inserir na sociedade um segmento marginalizado. São três decisões comprobatórias de que as relações homossexuais vêm sendo mais aceitas, seja pela sociedade em si, seja pelo Judiciário e agora, também, por um órgão governamental.
Nada mais justo. As relações entre duas pessoas do mesmo sexo são relações de amor, companheirismo, afeto e tudo o mais que envolve as relações heterossexuais. Daí não poder haver qualquer distinção entre elas, sob pena da ocorrência da discriminação e violação de princípios constitucionais que garantem a todos os cidadãos o direito à igualdade, à privacidade, liberdade e tantos outros.
Devemos considerar ainda que o fato de os casais homossexuais terem se exposto mais perante a sociedade também colaborou para que tivessem mais liberdade de pleitear seus direitos junto ao Poder Judiciário. A partir do momento em que expressam sua orientação sexual perante a sociedade, sentem-se mais à vontade para buscar a igualdade dos direitos conferidos aos casais heterossexuais.
A busca por esses direitos provoca reações no Poder Judiciário, que algumas vezes é levado a reconhecer tais uniões, sob pena de negar direitos a um segmento que também precisa de amparo e proteção, tal como conferido a todos os demais cidadãos.
As decisões de primeira instância, cada vez mais freqüentes, impulsionam os tribunais superiores a adotarem posturas semelhantes, levados que são à reflexão sobre as condições desta parcela da sociedade e das relações homoafetivas. São essas decisões favoráveis aos homossexuais que fazem com que um dia possamos dizer que nossa sociedade é justa e age de acordo com os princípios da igualdade pregados pela Constituição Federal, nossa lei maior.
Revista Consultor Jurídico, 23 de janeiro de 2006
Sobre o autor
Sylvia Mendonça do Amaral: é sócia fundadora do Correia da Silva & Mendonça do Amaral Advogados, membro do Ibdfam — Instituto Brasileiro de Direito de Família e autora do livro Manual Prático dos Direitos Homossexuais e Transexuais.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário