*por Cinthia Lerner
Mesmo estando no século 21 os casais homossexuais ainda têm muita dificuldade em configurar a união estável por estrita concepção jurídica. Não há lei que expressamente impeça a união estável entre pessoas do mesmo sexo, mas o que impede que seja configurada união estável entre casais do mesmo sexo são as disposições da Constituição Federal e do novo Código Civil que colocam essa união como sendo aquela estabelecida entre homem e mulher.
Nesse contexto tanto a doutrina como a jurisprudência acabam enxergando a relação homossexual como meramente uma sociedade de fato e não como uma união com o objetivo de construir família. O que, nos dias de hoje, é no mínimo injusto, pois a relação homossexual deve ser vista como qualquer outra relação, onde estão presentes o núcleo familiar, o vínculo afetivo e também o patrimonial.
As pessoas por hipocrisia esquecem que as relações homossexuais sempre existiram e sempre irão existir. Muitas vezes estão dentro da sua própria casa. Não seria muito mais fácil a regulamentação de tal união? Infelizmente não há como negar as inúmeras barreiras enfrentadas pelo casal homossexual quando estes resolvem se separar ou mesmo no falecimento do seu parceiro, pois a família, em sua grande maioria, despreza tal relação e entende ser a única herdeira de todos os bens do de cujus, ignorando a existência do parceiro que sem sombra de dúvida ajudou na construção de tal patrimônio.
Alguns tribunais, como o do Rio Grande do Sul, já possuem brilhantes julgados reconhecendo a união homossexual como uma união estável e permitindo inclusive que tais julgados sejam apreciados nas varas especializadas em direito de família e não nas varas cíveis.
Entretanto, não são todos que pensam desta forma, a grande maioria ainda entende como sendo somente uma sociedade de fato, constituída com bens dos sócios, que têm direitos e obrigações, como toda sociedade empresária.
Para tentar minimizar tais problemas, atualmente, o casal homossexual não só pode como deve registrar em cartório um contrato de união estável informando a existência da parceria, quando esta relação se iniciou, quais bens foram adquiridos na constância da união, como o casal pretende partilhar o que foi adquirido durante a união e inclusive firmar testamento sobre a forma que seus bens devem ser partilhados quando falecer.
Isso porque ainda que o tribunal não reconheça a relação homossexual como união estável, ele será obrigado a atender o que estiver disposto no contrato, claro, desde que não haja nenhuma convenção contrária à lei.
Assim o casal homossexual estará resguardando seus direitos, ainda que vivendo em uma sociedade até então preconceituosa, evitando tanto discussões judiciais decorrentes da partilha dos bens no caso de uma separação ou mesmo do falecimento de uma das partes. Utilizando a linguagem atual dos comercialistas podemos dizer que a celebração de um contrato e até a criação de um testamento seria uma forma de “blindar” o patrimônio do casal homossexual.
Revista Consultor Jurídico, 2 de agosto de 2005
Sobre o autor
Cinthia Lerner: é advogada associada ao escritório de Advocacia Andere Neto e especialista em Direito de Família.
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